Iniciaram-se as negociações entre trabalhadores, empresários e governo para a construção de propostas para 2 temas estratégicos para o futuro do mundo do trabalho no Brasil e para a qualidade do nosso projeto de desenvolvimento. O 1º aborda o funcionamento do sistema de relações de trabalho, da negociação coletiva e do sistema sindical. O 2º trata da regulação econômica e trabalhista das atividades produtivas e das relações de trabalho remoto.
Cada um dos temas será tratado por um GT (Grupo de Trabalho) específico sob a coordenação do Ministério do Trabalho e Emprego. Contam com a representação das Centrais Sindicais e suas entidades de base ao lado das Confederações empresariais.
As transformações no mundo do trabalho são profundas, extensas, intensas e decorrem de mudanças, muitas vezes disruptivas, na arquitetura, organização e funcionamento do sistema produtivo. As novas tecnologias e a inteligência artificial estão amalgamadas em todos os setores do sistema produtivo e progressivamente transformam atividades humanas cotidianas em atividades econômicas.
Essas mudanças no sistema econômico promovem constantes e contínuas transformações nos postos de trabalho e suas atribuições, nos requisitos para o exercício da função, nas qualificações e competências e nas profissões. Jornada de trabalho, formas de contratação e de remuneração, segurança e saúde no trabalho, vínculos e subordinações estão sendo impactados e exigem respostas rápidas, criativas, ousadas e, muitas vezes, tempestivas.
As relações de trabalho, que hoje envolvem cerca de 110 milhões de trabalhadores ativos no Brasil, precisam ser reguladas de maneira permanente, contínua e com segurança jurídica para as partes, ainda com as mudanças em curso. Só um sistema de negociação coletiva bem estruturado será capaz de criar esse tipo de resposta.
Por isso, as Centrais Sindicais formularam diretrizes para a construção de um projeto para valorizar e fortalecer a negociação coletiva em todos os níveis. Ao final esperam que as diretrizes tenham esferas de negociação colados às dinâmicas do setor produtivo e capacidade para tratar das questões e conflitos inerentes às relações de trabalho.Para isso, propõem que os sindicatos, base do sistema de representação, e toda a estrutura que compõe o sistema sindical, sejam fortalecidos. Entidades com ampla base de representação, alta representatividade, com capacidade de agregação e de unidade de ação, legitimadas por decisões democráticas das assembleias, podem negociar e celebrar acordos com as normas que irão reger as relações de trabalho e os direitos laborais.
O sistema sindical e de negociação coletiva deve ousar dar um salto institucional para a autonomia em termos de autorregulação. Cada parte deve poder definir o funcionamento do seu sistema sindical e as regras que devem reger os processos negociais.
TRABALHADORES DE APLICATIVO
As plataformas e os aplicativos são tecnologias disruptivas que estão transformando o sistema econômico, criando atividades produtivas e causando impactos setoriais e laborais extensos. Há perplexidade diante das inovações tecnológicas e da inteligência artificial, entre elas a de como regular essas novas formas de produzir e as relações de trabalho que ali se fazem presente.
O Brasil está pautando o enfrentamento desses desafios por meio da iniciativa de colocar os atores sociais para negociar as múltiplas dimensões regulatórias. A prioridade dos trabalhadores é estabelecer a proteção trabalhista (remuneração, jornada, condições de trabalho, entre outros aspectos), proteção previdenciária, social e sindical equivalente àquela que se faz presente no mundo laboral caracterizado pelo assalariamento clássico (um empregador e um trabalhador).
As caraterísticas dessas atividades econômicas mediadas por plataformas e aplicativos têm rompido com os atuais padrões produtivos e laborais. Para o mundo do trabalho se observa extensa precarização, desproteção laboral e previdenciária, insegurança profissional, entre outras mazelas.
As lógicas que estruturam essas novas empresas e as estratégias de negócio rompem com fundamentos pretéritos das atividades empresariais. O objetivo, papel e função social da empresa ganha outros contornos; o retorno esperado dos investimentos tem outro tempo e destinatário; o que é o negócio tem outras respostas; as relações de trabalho são tratadas sob outra ótica, etc.
O desafio é observar de maneira aprofundada o funcionamento desse novo sistema que se estrutura e que transforma seu entorno, exigindo um padrão de resposta mediado pelo interesse geral da sociedade e pelas demandas coletivas dos trabalhadores.
Nesses 2 casos, o Brasil poderá aportar inovações que podem se tornar referências positivas e virtuosas para outros países. Somos convocados a inovar nas propostas e a ousar nas iniciativas. A largada foi dada, os apoios serão fundamentais, os insumos essenciais e a dedicação para o trabalho colaborativo e a negociação é uma exigência.
Texto de Clemente Ganz Lúcio, ex diretor técnico do Dieese
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